quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Entrevista com Rodrigo Sant'anna



Rodrigo Sant'Anna (Foto: Zô Guimarães)

Sucesso no 'Zorra Total', Rodrigo Sant’anna lembra os tempos difíceis de antes da fama, conta como era a infância no Morro dos Macacos, comunidade da Zona Norte do Rio de Janeiro, e diz que tem um reencontro de vida com Thalita Carauta, sua parceira na TV -

Mesmo de cara limpa, sem a maquiagem de Valéria e Adelaide, personagens com os quais alcançou o sucesso no humorístico Zorra Total, Rodrigo Sant’anna é reconhecido pelos fãs nas ruas, que brincam com os bordões criados pelo comediante, como “Eu sou a cara da riqueza” e “Ai, como eu tô bandida!”.

O carinho do público dá noção do tamanho da popularidade do ator de 31 anos, que não se deixa seduzir com elogios. “Não me deslumbro com o sucesso”, afirma, sério. Carioca, Rodrigo foi criado no Morro dos Macacos, em Vila Isabel, Zona Norte do Rio de Janeiro, comunidade pacificada em 2010, antes conhecida pela violência. A experiência na favela e no subúrbio de Quintino, onde também morou, deram ao ator material para criar, em 2006, o espetáculo Os Suburbanos  após cursos no Tablado e na Casa das Artes de Laranjeiras (CAL).

A comédia fez de Rodrigo um sucesso e o levou à TV, onde participou do seriado A Diarista (2005) e ficou quatro anos na Turma do Didi. No Zorra desde 2010, ele também participa de dois programas de rádio no Rio e está em cartaz com o espetáculo 'Shrek – O Musical', vivendo o Burro. Seu sonho é trabalhar com Miguel Falabella, um de seus ídolos. O outro era Chico Anysio. “Ele passava no corredor, eu me escondia”, lembra.
QUEM: De onde veio a vontade de ser ator? Rodrigo Sant’anna: Já pensava nisso com 14 anos, mas escola de teatro era cara. Com 18, pedi para minha mãe o curso do Tablado. Já na faculdade, falei “quero fazer CAL” e não tinha grana. Trabalhava como operador de telemarketing e pedi demissão. Paguei o primeiro mês da CAL, minha mãe pagou o segundo e ficou endividada, no terceiro não ia ter dinheiro. Aí, passei em uma seleção de um projeto de apresentações educativas nas estações e trens do metrô. Foi o que custeou três anos e meio de aulas.
QUEM: Como foi sua experiência como atendente de telemarketing?
RS:
 Foi o pior ano da minha vida. Acordava 4h e meia da manhã. Imagina ficar seis horas com um headphone no ouvido e 15 minutos de intervalo.
QUEM: Chegou a ser xingado pelos clientes?
RS:
 Sim, mas eu desligava várias ligações. Se a pessoa vai xingar, a gente pode desligar. Hoje, do outro lado, já perdi a paciência também. Sempre peço para falar com o supervisor. O que descobri é que você tem que ligar muito estressado. Quando você entra calmo, vão tentar te engambelar.
QUEM: Teve outro emprego, além do telemarketing?
RS:
 Entreguei panfleto para uma clínica dentária, durou um dia. Fiz Tablado e CAL e fui fazer outro curso. Mas não aguentava mais, queria ganhar dinheiro. Fui para São Paulo, porque ouvi dizer que teatro lá era mais fácil. Fui de ônibus e passei o dia distribuindo currículo em shopping para ver se arrumava um emprego e conseguia me sustentar. Nenhuma loja me ligou até hoje. Desisti e fiquei no Rio.
QUEM: Quando veio a virada?
RS:
 Teve um concurso em um festival de esquetes e apresentei alguns, de Os Suburbanos. A Thalita Carauta ganhou o prêmio de melhor atriz nesse festival. Montamos o espetáculo e fizemos Os Suburbanos juntos. Aí, foi indo.
QUEM: Você e Thalita são amigos fora do trabalho?
RS:
 É uma amizade de mais de dez anos. A gente tem um reencontro de vida. Somos amigos, a televisão foi uma consequência.
QUEM: Conseguiu manter as amizades de antes da fama?
RS:
 Vivi uma realidade muito diferente da que tenho hoje. Vi amigos que já morreram no tráfico, outros foram para uma profissão digna. Ainda morava no Morro dos Macacos quando fazia o Tablado. Tinha aqueles amigos ali e ia fazer aula com o João Velho, filho da Cissa Guimarães. Ele fazia ensaio do Tablado com uma blusa da Gap que para mim era um sonho de consumo.
QUEM: Comprou a blusa da Gap quando teve dinheiro?
RS:
 Não. Fui para os Estados Unidos e vi que a Gap não era tudo isso (risos).
QUEM: Você viveu no Morro dos Macacos quando a comunidade não tinha sido pacificada. Como foi crescer nesse ambiente?
RS:
 A gente não se dá conta quando está vivendo a situação. Adorava ver tiroteio, era uma diversão. Imagina uma mesmice, você adolescente, mais um dia igual, aí começa um tiroteio, sai da janela. Isso era divertido. Sem hipocrisia, era mesmo. Quando já estava na TV, fui assistir a Tropa de Elite com a minha madrinha, Solange. Saí do cinema aos prantos, angustiado porque ela ainda vivia aquilo.
QUEM: Você não tinha a dimensão do risco que corria?RS: Quando estava crescendo, não tinha noção. Na época da faculdade, à noite, tinha que ligar, perguntar como estavam as coisas, “melhor não vir para casa”. Acabei indo morar com minha mãe por causa do inconveniente que é morar numa comunidade. Tá dando tiro, fica aí embaixo.
QUEM: Por que você não morava com sua mãe?
RS: 
Meus pais, Ana Lúcia e Francisco, se separaram quando eu tinha 2 anos. Minha mãe tinha que trabalhar e precisava me deixar com alguém. Fui criado pela minha madrinha até os 17 anos, mas minha mãe foi superpresente. Tive duas mães.
QUEM: E seu pai?
RS:
 Meu pai foi muito ausente durante a minha vida. Hoje, somos muito unidos porque a família inteira trabalha e viaja comigo.
QUEM: Você começou e largou duas faculdades, de turismo e psicologia. Qual foi a reação da sua família?
RS:
 Foi uma crise, até porque minha mãe se matava para conseguir pagar a faculdade. Até hoje ela fala: “Só não me conformo de o RODRIGO não ter se formado”. Mas entendo, na minha profissão você pode ser muito bem-sucedido ou muito fracassado.
QUEM: Pensou em desistir?
RS:
 Você sempre tem medo de que não dê certo, tem vontade de desistir. Teve uma época em que fazia Os Suburbanos e não tinha dinheiro para pagar o empréstimo que minha mãe estava pagando.
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Rodrigo Sant'Anna (Foto: Zô Guimarães)
QUEM: Tem ídolos?RS: Miguel Falabella, sonho trabalhar com ele. Chico Anysio era um gênio. Por causa da timidez, ele passava no corredor e eu me escondia. Um dia, me chamou para conversar, disse que gostava do meu trabalho. Convidei o Chico para me ver no teatro, e ele foi de cadeira de rodas. Depois me disseram que foi o último espetáculo que viu.
QUEM: Sempre foi tímido?
RS:
 Sim. Na escola, nunca me oferecia para ler. Encontrei com o Leandro Hassum, que me deu aula no Tablado, e ele disse: “Não sei o que você fez, porque você era muito ruim”. Eu era muito travado.
QUEM: Quando você “fica bandido”?
RS:
 Com injustiça, fico bem bandido. E, no meio de amigos, quando estou mais à vontade.
QUEM: Você está namorando?
RS:
 Agora não. De um tempo para cá, ando pensando em filhos.
QUEM: A profissão trouxe estabilidade financeira?
RS:
 Trouxe estabilidade, mas trouxe responsabilidades, o condomínio que não existia e que tenho que pagar. Tirei minha mãe do subúrbio!
QUEM: Tem casa própria?
RS:
 Sim. Mas não me deslumbro com o sucesso, com estar morando na Zona Sul. Acho incrível estar perto da praia, era um sonho de consumo, sempre tive que pegar ônibus para ir à praia.
QUEM: E hoje, que você mora perto da praia?
RS:
 Não tenho tempo para ir à praia!
Rodrigo Sant'Anna (Foto: Zô Guimarães)

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